A destruição parcial da barragem de Kakhovka, no Sul da Ucrânia, provocou, pelo menos até à hora de fecho desta edição, inundações em 24 localidades e a retirada de cerca de mil civis da zona, anunciou ontem o ministro do Interior ucraniano, Igor Klymenko.
As autoridades ucranianas disseram anteriormente que as inundações podem afectar 26 mil pessoas em 80 localidades. A aplicação Maps, da Google, já assinala as cheias na região de Kherson, onde se situa a barragem.
Kiev e Moscovo acusaram-se mutuamente pela destruição da barragem.
A Rússia perdeu o controlo de parte da região de Kherson durante uma contra-ofensiva ucraniana em Outubro, controlando agora apenas a margem esquerda do rio Dniepre.
Kherson é uma das quatro regiões anexadas pela Rússia em Setembro, sete meses depois de ter invadido a Ucrânia.
Na mesma altura, Moscovo declarou como anexadas as regiões de Donetsk, Lugansk e Zaporijia, onde se situa a maior central nuclear da Europa.
A Rússia já tinha ocupado e anexado a península ucraniana da Crimeia, em 2014.
A Ucrânia e a generalidade da comunidade internacional não reconhecem a soberania russa nas cinco regiões anexadas.
Até ao fecho desta edição, cerca de 800 pessoas, 66 das quais com mobilidade reduzida, já tinham sido retiradas pela Cruz Vermelha e pelos serviços de emergência ucranianos.
Peskov nega envolvimento
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, negou, ontem, que Moscovo tivesse sido culpado pela destruição da barragem em Kherson.
Durante a manhã de ontem, responsáveis de ambos os lados acusaram o outro de destruir o local.
"Estamos a falar de uma sabotagem deliberada por parte da Ucrânia. Esta sabotagem pode resultar em sérias consequências para dezenas de residentes da região”, afirmou Peskov, citado pela agência Tass há perigo imediato”.
Moscovo acusa Kiev na ONU
"Na noite de 6 de Junho, o regime de Kiev cometeu um crime impensável ao explodir a barragem da central hidroeléctrica de Kakhovka, resultando numa descarga descontrolada de água no rio Dniepre”, disse o embaixador russo junto da ONU, Vasily Nebenzya, numa reunião do Conselho de Segurança agendada de urgência.
O diplomata russo acusou as autoridades ucranianas de já terem idealizado no ano passado um ataque contra esta infra-estrutura, localizada numa zona sob controlo de tropas russas, e lamentou que o Conselho de Segurança nada tenha feito face a esses alertas.
Moscovo enviou uma carta à ONU em Outubro do ano passado na qual denunciava "os planos do regime de Kiev para destruir a barragem” e, em particular, a possibilidade de "lançar minas marítimas no rio Dniepre ou um ataque maciço com mísseis”.
Nebenzya defendeu a tese de que a Ucrânia finalmente optou por destruir a instalação devido ao apoio incondicional do Ocidente e à sensação de "impunidade”, considerando que a acção pode constituir um "crime de guerra”.
Segundo o embaixador russo, esta "sabotagem” teria dois objectivos: desviar as atenções para facilitar o reagrupamento das tropas ucranianas numa altura em que, disse, a contra-ofensiva não está a avançar; e causar "o máximo dano humanitário” à população.
Zelensky pede ao mundo para reagir
O Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, considerou que "o mundo deve reagir” à destruição parcial da barragem de Kakhovka.
"O mundo deve reagir. A Rússia está em guerra contra a vida, contra a natureza, contra a civilização”, indicou na rede social Telegram, acusando os russos de terem minado a barragem antes de a fazerem "explodir”.
"A Rússia fez explodir uma bomba, provocando danos ambientais massivos”, afirmou Zelensky num discurso por videoconferência aos "Nove de Bucareste”, uma organização que reúne nove países da Europa central e oriental membros da OTAN, segundo um vídeo partilhado pelos seus serviços.
Enquanto isso, o Secretário-Geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, considerou a destruição da barragem ucraniana uma "monumental catástrofe humanitária, económica e ecológica” e "outra consequência devastadora da invasão russa” da Ucrânia.
Em declarações à imprensa na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, António Guterres indicou que a ONU não tem acesso a informações independentes sobre as circunstâncias que levaram à destruição da barragem, mas afirmou que as consequências estão a ser sentidas em dezenas de cidades.
"Uma coisa é certa: esta é outra consequência devastadora da invasão russa da Ucrânia. Estamos a ver os efeitos na cidade de Kherson, na cidade de Nova Kakhovka e em 80 outras localidades ao longo do rio Dnipro”, disse o Secretário-Geral da ONU.
"Grandes inundações. Evacuações em grande escala. Devastação ambiental. Destruição de culturas recém-plantadas. E acrescentou ameaças à altamente ameaçada central nuclear de Zaporijia, a maior instalação nuclear da Europa”, descreveu o líder da ONU.