Brasil tem potencial para apoiar negociações de paz na Ucrânia
O analista chinês Zhou Zhiwei frisou ontem o potencial do Brasil como “parceiro de cooperação” da China na promoção do diálogo entre a Rússia e a Ucrânia, apontando a experiência de Brasília na coordenação de disputas regionais.
"O Brasil pode tornar-se numa força para a paz” e um "parceiro de cooperação da China na promoção activa das negociações entre a Rússia e Ucrânia”, afirmou à agência Lusa o director do Centro de Estudos Brasileiros da Academia Chinesa de Ciências Sociais, um grupo de reflexão ('think tank') sob tutela do Governo chinês, na véspera da chegada do presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, à China.
Zhou Zhiwei afirmou que o multilateralismo é uma "tradição importante da diplomacia” do Brasil. "Na actual situação, em que o multilateralismo é obstruído pelos países desenvolvidos, a China e o Brasil precisam de coordenar [entre si] e manter um ambiente de cooperação multilateral, que é crucial para todos os países em desenvolvimento”, defendeu o académico. Durante os primeiros dois mandatos de Lula da Silva, entre 2003 e 2011, a relação comercial e política entre Brasil e China intensificou-se, marcada, em particular, pela constituição do bloco de economias emergentes BRICS, que inclui ainda a Rússia, Índia e África do Sul.
O grupo reuniu-se pela primeira vez em 2009 - na altura ainda sem a África do Sul - e logo estabeleceu uma agenda focada na reforma da ordem internacional, visando maior protagonismo dos países emergentes em organizações como as Nações Unidas, o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional. No conjunto, os BRICS representam cerca de 40 por cento da população mundial e 23 por cento do produto global bruto.
A relação entre Pequim e Brasília arrefeceu, no entanto, durante o mandato de Jair Bolsonaro, que assumiu o poder com a promessa de reformular a política externa brasileira, com uma reaproximação aos Estados Unidos, e pondo em causa décadas de aliança com o mundo emergente. "A cooperação entre Pequim e Brasília é do interesse dos dois países e dos países em desenvolvimento como um todo”, apontou Zhou. "Promover a reforma do sistema internacional é uma parte importante da cooperação entre a China e Brasil”, acrescentou.
A China afirmou ser neutra na guerra na Ucrânia, mas mantém uma relação "sem limites” com a Rússia e recusou-se a criticar a invasão. O país criticou antes a imposição de sanções a Moscovo e culpou abertamente o alargamento da NATO pela guerra. Num documento proposto, em Fevereiro passado, para pôr fim ao conflito, Pequim destacou a importância de "respeitar a soberania de todos os países”, numa referência à Ucrânia, mas apelou também ao fim da "mentalidade da Guerra Fria” - um termo frequentemente usado pela China para criticar a política externa dos Estados Unidos. Lula da Silva propôs a criação de um grupo de países não envolvidos na guerra para negociar a paz na região. O Brasil foi o único membro dos BRICS a votar a favor de resoluções de condenação da invasão nas Nações Unidas.
Tolerância zero
contra o racismo
O Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva alertou esta segunda-feira a direcção do Carrefour que "não admite racismo” no seu país, após um novo caso de alegada discriminação racial num estabelecimento do grupo francês. "Temos que dizer à direcção do Carrefour: se eles querem fazer isso no país de origem, que façam, mas neste país não vamos admitir o racismo”, disse Lula da Silva, numa reunião ministerial em Brasília, por ocasião dos primeiros 100 dias da sua gestão.
O Presidente brasileiro citou o caso de uma professora negra da cidade de Curitiba, no sul do país, que acusou um segurança de segui-la enquanto fazia compras numa loja da rede Atacadão, que pertence ao grupo Carrefour. Segundo o jornal O Globo, a mulher, ao perceber que estava sendo vigiada de perto pelos seguranças, saiu, mas resolveu voltar ao supermercado e, em protesto, ficou só em roupa interior para mostrar que não estava roubando antes de terminar de fazer suas compras.
"Eles cometeram mais um crime de racismo. Um guarda do Carrefour acompanhou uma negra que ia comprar alguma coisa, pensando que ia roubar. Ela teve que ficar de sutiã e calcinha para mostrar que não ia roubar. É a segunda vez que o Carrefour faz esse tipo de coisa”, criticou Lula da Silva.
Este é o segundo caso de suposto racismo cometido numa unidade da rede francesa conhecido nos últimos dias, depois de outro problema semelhante denunciado por um homem negro que é marido da jogadora brasileira de voleibol Fabiana Claudino. Vinicius de Paula contou nas suas redes sociais que uma empregada de caixa de um estabelecimento Carrefour em São Paulo se recusou a atendê-lo na fila preferencial, apesar da área estar vazia no momento, mas momentos depois recebeu um cliente branco sem problemas.
Em nota enviada a O Globo, o Carrefour admitiu que o marido da jogadora de voleibol foi rejeitado sem justificação e indicou que demitiu imediatamente a funcionária da caixa, que estava em período experimental. "A nossa política é de tolerância zero contra qualquer tipo de comportamento desrespeitoso” e "nos últimos dois anos, o Carrefour assumiu a responsabilidade de fazer uma transformação de dentro para fora na luta contra o racismo estrutural no país”, disse a empresa.