Panela de Koka Mbala” regressa aos palcos quatro décadas depois

A tradição e modernismo são alguns dos aspectos que caracterizam o espectáculo “Panela de Koka Mbala”, que o grupo Experimental de Teatro vai exibir no dia 25 deste mês, às 19h00, no Royal Plaza Hotel, quatro décadas depois da primeira exibição, em 1981, inserido no projecto “Teatro Elite”.

Ancestralidade, filosofia, história, política, compaixão e rivalidade compõem o enredo do espectáculo, uma adaptação da obra do dramaturgo congolês Guy Menga, com encenação de Domingos Viana "Sting”.

O espectáculo apresenta as vivências e as "barreiras ideológicas” de um reino denominado "Koka Mbala”, que é liderado pelo rei "Binstamou”, personagem interpretado pelo actor Salvador Freire dos Santos "Dr. Miley”.

Sobre o seu personagem, Dr. Miley descreve-o como um rei que fez boas amizades, mas também muitos inimigos. Ao longo do reinado, o rei procura criar um certo equilíbrio na governação. Entretanto, o seu posicionamento nunca foi bem visto pelos "notáveis”, os conselheiros do rei.

Os problemas na comunidade surgem depois de o rei começar a dar uma maior atenção à  importância de inserir a juventude na tomada de decisões do conselho, coisa proibida para quem ainda não tinha atingido 18 anos. Diante de um cenário de divergências, os conselheiros alertam o rei para os perigos das suas decisões, consideradas "imaturas e irresponsáveis”.

Durante a liderança de Koka Mbala passa a existir uma imposição dos "espíritos da panela”, que foram mortos injustamente e fazem apelos à justiça e à necessidade de uma revolução no reino, tendo em conta que as mortes que ocorriam eram maioritariamente de jovens.

Salvador Freire dos Santos conta que, durante o espectáculo, a plateia vai ter contacto com uma peça cujo propósito é trazer à reflexão alguns tabus sobre tradições, onde os espíritos "despertam” para alertar o próprio rei, tendo em atenção os actos que foram praticados contra os direitos humanos. Os espíritos aparecem nos sonhos do rei e o informam da necessidade de se tomar uma decisão para acabar com as mortes em Koka Mbala, porque o sangue dos mortos clamava por justiça.

Devido à pressão que sofria da população, o rei é "obrigado” a tomar a decisão de combater o próprio regime, composto pelos seus conselheiros, que, provavelmente, estavam na origem das mortes selectivas das pessoas, sobretudo dos jovens. O rei destituiu, assim, o conselho que o queria fora dos destinos de Koka Mbala. Introduziu no conselho jovens que não eram, nem de perto nem de longe, do agrado dos conselheiros. Questões dos direitos humanos, a inserção da juventude nos problemas da comunidade e as questões do direito costumeiro são aspectos abordados na peça, no sentido de tornar uma sociedade mais justa e mais humanista, onde a morte deixou de ser a "sentença”, a forma extrema de penalização dos malfeitores na comunidade.

O grande feiticeiro

António de Oliveira "Delón” faz o papel de conselheiro principal do rei (Bobo), aquele que é o mais próximo de Binstamou.

A peça apresenta um "cruzamento entre o modernismo e os costumes de uma sociedade mais tradicional, em que o personagem Bobo se torna o guardião das leis do passado”.

Independentemente de ser o principal conselheiro, Bobo torna-se uma figura de proa e tido como um dos grandes feiticeiros de Koka Mbala. Ele conhece as leis e determina a conduta das comunidades. Por causa da "violação das leis ancestrais”, em que nenhum jovem antes de atingir a maioridade (18 anos) tem o direito de fazer parte do conselho, muito menos seduzir uma mulher, os conflitos agudizam-se. Os membros do conselho entram em divergência.

"O poder estava na pa-nela, porque os espíritos se comunicavam com o Bobo por ser ele o grande feiticeiro e detentor do poder local”, destacou Delón.

De acordo com o actor, a peça "Panela de Koka Mbala” já recebeu vários prémios e distinções internacionais, atribuídas pelo Comité Internacional do Teatro, Associação Internacional do Teatro e pela Unesco.

Em 1972, conta, trabalhavam na adaptação de alguns textos literários nacionais e internacionais para o teatro, dos quais se destacam as obras "Domingos Xavier”, de Luandino Vieira, e "A Corda”, de Pepetela, o que incentivou uma maior pesquisa sobre a dramaturgia angolana, na época com poucos registos.

"Houve a necessidade de se fazer, também, uma pesquisa à dramaturgia africana com textos de autores nigerianos, camaroneses e congoleses, tendo prevalecido a última opção, por unanimidade, por ser uma realidade mais aproximada da angolana”.

Os conselheiros e o papel na sociedade

O actor Maurício Tavira desempenha na peça o papel de um dos guardas do rei, personagem que volta a interpretar 42 anos depois. No espectáculo, o seu objectivo é proteger o reino de Koka Mbala.

Em declarações ao Jornal de Angola, durante uma das sessões de ensaios, o actor explicou que está a ser uma experiência única e memorável voltar a interpretar o mesmo personagem de 1981, época em que a peça se estreou no antigo Teatro Avenida.

O actor Luís Pimentel faz parte dos "notáveis e bailarinos”, que actuam como o "camaleão”, sem qualquer posicionamento certo, mudando de cor de acordo com o momento, para, claro, tirar vantagens pessoais. Por sua vez, o actor Álvaro Miguel (notável número um e conselheiro) apoia as ideias do conselheiro principal do rei. A missão dos notáveis é levar para o palácio do rei as preocupações do povo e as políticas que devem ser implementadas para a melhoria das condições de vida das populações.

António da Costa "Mandela” interpreta o personagem do notável número três, um dos conselheiros do rei cujo papel é defender as ideias do Bobo, o conselheiro chefe do rei, que tem como objectivo a destituição do rei pelo facto de o mesmo não defender os costumes dos ancestrais, uma tradição antiga em Koka Mbala.

O eterno rei   "aprova” o espectáculo

O actor Humberto Jorge foi o primeiro rei do espectáculo "Panela de Koka Mbala”, exibido pela primeira vez em 1981, porque os protagonistas da época foram recrutados para o cumprimento do serviço militar obrigatório, de acordo com o actor.

Humberto Jorge foi convidado a acompanhar os ensaios na escola Njinga Mbande, em Luanda, tendo referido que na época o espectáculo de teatro tinha a encenação e direcção da brasileira Maladise Sanches, que trabalhava no país.

Durante os ensaios, fez alguns reparos, prontamente acatados pelo seu substituto na peça. De maneira geral, afirma, a obra está bem montada. Por causa de um problema de visão (glaucoma), o primeiro rei de Koka Mbala tem estado a viver entre Angola e Portugal, devido ao agravamento do seu estado de saúde, que nos últimos tempos requer uma atenção especial.

Os desafios de uma actriz consagrada

Figura incontornável das artes cénicas no país, com destaque para o teatro, Conceição Diamante, actriz do grupo Julu, valorizou e agradeceu o convite de poder fazer parte neste projecto.

A figura de Conceição Diamante está associada à personagem "Catarina”, da telenovela de produção nacional "Reviravolta”, papel de maior relevância da sua carreira, mas nesta peça de teatro desempenha um papel secundário, mas que, ainda assim, não a fez se sentir diminuída. Disse que se sente honrada em participar no renascimento da peça, 42 anos depois da estreia.

Afirmou que está a ser uma experiência notável poder fazer parte de um projecto que tem mais de quatro décadas de existência. "Faço o papel de uma rainha, mas que não tem o mesmo protagonismo que a mulher do rei de Koka Mbala, mas me sinto muito honrada de fazer parte do elenco”.

Pedro João Cassule Manuel Manuel

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